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7 de Maio de 2024
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    A palavra da vítima nos crimes de estupro

    Publicado por Nova Criminologia
    há 14 anos

    Em 13 de agosto de 2010, o site R7 publicou matéria pertinente a condenação do norte-americano, Michael Green, por crime de estupro, tendo ele permanecido recluso por 27 anos. A condenação se dera baseada unicamente no depoimento da vítima, que, violentada por quatro homens, não reconheceu o seu algoz na primeira tentativa de identificação. Dias depois, o acusado foi novamente colocado entre vários suspeitos para uma nova oportunidade de reconhecimento, sendo que desta vez a vítima o elegeu seu carrasco. Sua inocência foi provada quase três décadas posteriores por meio de um exame de DNA.

    Nos Estados Unidos, a falta de credibilidade das identificações oculares de suspeitos por vítimas ou testemunhas ocorridas em delegacias, tem libertado dezenas de presos após realização do exame de código genético.

    No Brasil, as coisas não são diferentes. O site Consultor Jurídico publicou no dia 31/08/06, fato ocorrido no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em 1995.

    Um homem de 61 anos, Adão Manoel Ramires, condenado a oito anos de prisão em regime fechado, dos quais cumpriu cinco, acusado pelo estupro de uma jovem de vinte e quatro anos com problemas mentais. Ela engravidou de gêmeos e apontou Ramires como o autor da violência. Na ocasião do fato, foi realizado um exame pelo método GSE, atribuindo ao gaúcho 60% de chances de ser o pai dos gêmeos. Com base nesta análise laboratorial e na palavra da vítima, uma mulher com idade mental avaliada em seis anos, o ancião foi recolhido ao cárcere.

    Após cinco anos no calabouço, seu advogado ajuizou ação de Revisão Criminal na qual requereu exame de DNA, cujo resultado negou-lhe a paternidade das crianças, absolvendo-o pelo crime, conforme se confere da decisão abaixo disponibilizada:

    Ainda que, em princípio, a exclusão de paternidade das crianças a que deu a luz a vítima não implique automático afastamen (gêmeos) to de autoria de estupro imputado ao réu, visto que, por óbvio, dessa infração não resulta, necessariamente, gravidez, o fato é que, nas circunstâncias, desde a denúncia, vinculada a ação tida como delituosa à dita gravidez. Daí é que resultou afirmação, pela sentença condenatória, da honestidade da vítima, razão de se lhe ter emprestado crédito, moça com 24 anos e com problemas físicos e mentais. Prova nova, assim, consistente no teste de DNA que afastou paternidade, com aptidão para desconstituir os alicerces da condenação. Revisão acolhida, para proclamação de desconstituição da condenação e afirmação do dever de estado de indenizar. (TJRS 4º Grupo Criminal Revisão Criminal nº 70012499000. Comarca de Rosário do Sul. Requerente: Adão Manoel Ramires. Requerido: Ministério Público. Rel. Desa. Fabianne Breton Baisch . Data do Julgamento: 28/04/06).

    A carência de provas materiais é o grande empecilho para uma adequada condenação a acusados de crimes de índole sexuais, a maioria das vezes praticados em locais ermos, sem testemunhas e a dificultar as possibilidades de socorro.

    A realização do exame de corpo de delito nem sempre se faz necessária, pois o crime em berlinda pode ser praticado sem deixar vestígio material, sendo prescindível sua feitura para uma eventual condenação, de modo que, a falta de tais provas é suprida pelas palavras da vítima, o que pode acarretar em condenações infundadas. Nesse sentido, vem decidindo os tribunais, conforme se confere no seguinte aresto do insigne Tribunal de Justiça do Estado do Paraná:

    1- A palavra da vítima, em sede de crimes contra a liberdade sexual, é de vital importância e só pode ser desprestigiada com a produção de provas cabais a demonstrar a falácia de suas declarações. Nos casos de crime contra os costumes, o relato da vítima se reveste de especial valor probatório, principalmente pelas circunstâncias clandestinas em que esses crimes normalmente são perpetrados. (TJPR Apelação Criminal nº 564869-3. Rel. Des. Miguel Pessoa, 4ª Câmara Criminal. Julgamento: 17/09/09).

    Os crimes contra a dignidade sexual, quando cometidos sem deixar um conjunto probatório robusto, ocasionam uma séria dúvida: a palavra do ofendido, incriminando, opondo-se à palavra do acusado, negando. Porém, a orientação do STF é a condenação baseada somente na palavra da vítima ante a inexistência da materialidade da infração e de testemunhas, quase impossível nesses casos:

    Muitas mulheres, vítimas de violência sexual, preferem se calar a procurar a autoridade policial em busca de providências. Boa parte dessas mulheres acredita que, como o estupro não foi presenciado por nenhuma testemunha, ou que a violência não deixou nenhuma marca no corpo, que será impossível prender o criminoso. Todavia, isso não é verdade. A palavra da vítima nos crimes cometidos na clandestinidade, como o crime de estupro, possui um valor probante excepcional. Assim, se as declarações da vítima são coerentes e harmônicas, os Tribunais brasileiros, seguindo orientação do Supremo Tribunal Federal, vêm sistematicamente condenando os agentes, apesar da ausência de testemunhas. .

    Para Guilhe (STF, 2ª Turma, relator Ministro Maurício Corrêa, Habeas Corpus n. 79.850-1, julgado em 28.3.2000, DJU de 5.5.2000, p. 21) rme de Souza Nucci, em sua obra, Crimes Contra a Dignidade Sexual, nos delitos de estupro, o mais grave problema enfrentado para se apurar e punir o agente é a formação de prova robusta, apta a gerar convicção no julgador. Para sanar esta questão, deve o magistrado avaliar o passado comportamental de ambos, buscando confiabilidade na palavra daquele que mais lhe passar veracidade e honestidade, aduz o mestre paulista.

    A maior dificuldade em conferir credibilidade à palavra da vítima ou do acusado está no uso, como método avaliatório, do comportamento social e da confiança que os envolvidos transmitem ao Juiz, pois a crença é subjetiva, podendo o julgador acreditar naquele que não está com a verdade, absolvendo ou condenando injustamente, como ocorreu no episódio envolvendo o tribunal gaúcho, ao emprestar crédito a uma moça com vinte e quatro anos, com transtornos mentais, na qual o sentenciante atribuiu honestidade às suas palavras.

    Contudo, não se pode negar relevância à palavra da vítima, afinal, se ela sofreu um constrangimento, ninguém melhor que própria para apontar o seu ofensor, todavia, o judiciário deve se revestir de todos os cuidados para se evitar condenações desarrazoadas, capazes de se espalhar a revolta, fazendo valer aquele vetusto brocardo jurídico, mais vale um culpado livre, que um inocente preso, para não se repetir as mesmas histórias acima narradas.

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