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    PRESCRIÇÃO RETROATIVA E A LEI N. 12.234, DE 5 DE MAIO DE 2010

    Publicado por Nova Criminologia
    há 14 anos

    O Estado, como ente dotado de soberania, detém, exclusivamente, o direito de punir ( jus puniendi ). Para satisfazer a pretensão punitiva, deve agir dentro de prazos determinados, sob pena de perdê-la.

    Prescrição é, justamente, a perda da pretensão concreta de punir o criminoso ou de executar a punição, devido à inércia do Estado durante determinado período de tempo. Fundamenta-se em dois pressupostos: a) inconveniência da aplicação da pena muito tempo após a prática da infração penal; b) combate à ineficiência, pois o Poder Público deve ser compelido a agir dentro de prazos determinados.

    Por conseguinte, só pode haver duas espécies de prescrição: a) prescrição da pretensão punitiva (PPP): é perda do poder-dever de punir, em face da inércia do Estado durante determinado lapso de tempo; b) prescrição da pretensão executória (PPE): é a perda do poder-dever de executar a sanção imposta, em face da inércia do Estado, durante determinado lapso de tempo.

    Dependendo do momento processual em que o Estado perde o seu direito de aplicar a pena, e de acordo com o critério para o cálculo do prazo, a prescrição da pretensão punitiva se subdivide em:

    a) PPP propriamente dita: calculada com base na maior pena prevista no tipo legal (pena abstrata);

    b) PPP intercorrente ou superveniente à sentença condenatória: calculada com base na pena efetivamente fixada pelo juiz na sentença condenatória e aplicável sempre após a condenação de primeira instância;

    c) PPP retroativa: calculada com base na pena efetivamente fixada pelo juiz na sentença condenatória e aplicável da sentença condenatória para trás;

    d) PPP antecipada, projetada, perspectiva ou virtual: reconhecida, antecipadamente, com base na provável pena fixada na futura condenação.

    Diante do advento da Lei n. 12.234, de 5 de maio de 2010, que entrou em vigor na data de 06 de maio de 2010, passou-se a questionar se houve a abolição da prescrição retroativa.

    Segundo o antigo preceito legal, constante do 1º do art. 110, A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada. E, consoante seu 2º, A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa.

    Pois bem. O dispositivo em comento trata da chamada prescrição retroativa, modalidade de prescrição da pretensão punitiva.

    É a calculada pela pena concretamente fixada na sentença condenatória, desde que haja trânsito em julgado para a acusação ou desde que improvido o seu recurso. Enquanto a prescrição intercorrente ocorre entre a publicação da sentença condenatória e o trânsito em julgado para a defesa, a retroativa é contada da publicação dessa decisão para trás. É como se o tribunal estivesse retrocedendo do presente ao passado, gradativamente.

    Por essa razão, se o tribunal constatar que não ocorreu prescrição pela pena concreta entre a publicação da sentença condenatória e o acórdão, passará imediatamente a conferir se o novo prazo prescricional, calculado de acordo com a pena concreta, não teria ocorrido entre:

    a) a data do fato e o recebimento da denúncia ou queixa;

    b) entre o recebimento da denúncia ou queixa e a publicação da sentença condenatória (no caso de crimes não dolosos contra a vida).

    Exemplo da necessidade de proceder à recontagem retroativa: o prazo prescricional do furto simples calculado pela pena abstrata é de 8 anos (pena máxima = 4 anos de reclusão), mas, se a pena concreta for aplicada no mínimo de um ano, esse prazo despencará para 4 anos. É bem possível que, embora não tendo decorrido 8, tenham-se passado mais de 4 anos entre a data do fato e a do recebimento da denúncia. Assim, na recontagem pela pena concreta, ter-se-á operado a prescrição da pretensão punitiva, pela modalidade prescrição retroativa.

    O que foi modificado com a promulgação da Lei n. 12.234/2010? De acordo com a nova redação do art. 110, 1º, A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. O 2 o , por sua vez, acabou, sendo revogado pelo aludido Diploma Legal.

    Com isso, o que houve, na verdade, foi apenas a vedação da prescrição retroativa incidente entre a data do fato e o recebimento da denúncia ou queixa (a lei equivocadamente não menciona a palavra recebimento. Com relação ao março temporal constantes da alínea b (entre o recebimento da denúncia ou queixa e a publicação da sentença condenatória - no caso de crimes não dolosos contra a vida), esse instituto continua a ser aplicável.

    Nesse contexto, não se operará a prescrição retroativa antes do recebimento da denúncia ou queixa, isto é, durante a fase do inquérito policial ou da investigação criminal, em que ocorre a apuração do fato, mas poderá incidir a prescrição da pretensão punitiva pela pena máxima em abstrato.

    Tal alteração legislativa também surtiu efeitos no instituto da prescrição virtual , perspectiva, projetada ou antecipada, uma das espécies de prescrição da pretensão punitiva. Muito embora a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça tenha aprovado a Súmula 438, que reconhece a sua inadmissibilidade, essa modalidade de prescrição ainda vem sendo aplicada pelos operadores do direito, de onde decorre a necessidade de sua análise.

    Concebe-se que a prescrição virtual é aquela reconhecida antecipadamente, com base na provável pena concreta, que será fixada pelo juiz, no momento futuro da condenação. Fundamenta-se no princípio da economia processual, uma vez que de nada adianta movimentar inutilmente a máquina jurisdicional com processos que já nascem fadados ao insucesso, nos quais, após condenar o réu, reconhece-se que o Estado não tinha mais o direito de puni-lo, devido à prescrição retroativa. Essa modalidade de prescrição, portanto, está atrelada ao instituto da prescrição retroativa.

    Para elucidar o tema, exemplifiquemos: o promotor de justiça, na fase extrajudicial, deparando-se com um inquérito policial versando sobre furto simples tentado, cometido há 5 anos, não pode requerer seu arquivamento com base na prescrição, uma vez que, antes da condenação, aquela é calculada com base na maior pena possível. Ocorre que a maior pena possível do furto simples é de 4 anos, e a menor redução decorrente da ten tativa, 1/3 (como se busca a maior pena possível, deve-se levar em conta a menor diminuição resultante da tentativa, pois, quanto menos se diminui, maior fica a pena). Tomando-se 4 anos (máximo da pena in abstracto ), menos 1/3 (a menor diminuição possível na tentativa), chega-se à maior pena que um juiz pode aplicar ao furto simples tentado: 2 anos e 8 meses de reclusão. O prazo prescricional correspondente a 2 anos e 8 meses de pena é de 8 anos (cf. art. 109, IV, do Código Penal). Ainda não ocorreu, portanto, a prescrição, com base no cálculo pela pena abstrata (cominada no tipo). O promotor, porém, observa que o indiciado é primário e portador de bons antecedentes, e não estão presentes circunstâncias agravantes, tudo levando a crer que a pena será fixada no mínimo legal e não no máximo. Confirmando-se essa probabilidade, teria ocorrido a prescrição, pois a pena mínima do furto simples é de um ano, e, com a redução da tentativa, qualquer que seja o quantum a ser diminuído, ficará inferior a um ano. Com base nessa provável pena mínima já teria ocorrido a prescrição, nos termos do art. 109, inciso VI, atualmente, com a nova redação determinada pela Lei n. 12.234/2010 (que elevou o prazo mínimo prescricional de dois para três anos).

    Nesses moldes, o sobredito instituto nada mais consiste do que o reconhecimento da prescrição, com base na provável pena mínima, que será fixada pelo juiz. Para quê movimentar toda a máquina do Estado, se lá na frente, na sentença, será reconhecida a prescrição retroativa nesse período que antecede o recebimento da denúncia ou queixa?

    Entretanto, na medida em que a prescrição retroativa não pode, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa, por força da Lei n. 12.234/2010, também não há mais se falar em prescrição virtual entre a data do fato e o recebimento da denúncia ou queixa. Nesse contexto, no exemplo acima aludido, não mais será a incidência da prescrição virtual na fase extrajudicial.

    Isso não quer dizer, entretanto, que a prescrição virtual foi abolida, pois o lapso prescricional poderá ser contado a partir do recebimento da peça inicial acusatória e a publicação da sentença condenatória, tal como sucede com a prescrição retroativa.

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